terça-feira, 2 de outubro de 2007

Diálogo sobre as particularidades do sono.

“Os sonhos são para os loucos. Perde-se tempo e a vontade diminui com a idade.” afirma o homem de aspecto ingénuo e frágil.
“Estás a baluciar o quê? Diz lá. Os sonhos são para os loucos… ou são os loucos loucos por perseguirem sonhos?” avança o estranho de casaco escuro de gola alta.
“Diz-me tu!” diz o homenzinho.
“Não, não. Espirra essas tuas explicações para outro. Tu é que falaste nisso, tu é que explicas o teu comentário.”
“Pois… pois sim, tens razão.” Salpica o homenzinho, cada vez mais nervoso. “Então os sonhos são para os loucos. Afirmei-o há cerca de um instante. Pois que tipo de coisas se passaram na vida de um homem para quando o olho fecha e o cérebro dorme, se passarem tais eventos ridículos e insensatos?”
O homem sombrio, que manuseava qualquer coisa brilhante na mão esquerda, levanta a cabeça de modo a olhar directamente nos olhos do homem, retorquindo. “Pois, sabes, os sonhos vêm da união entre os mecanismos do cérebro e a nossa, ou nem sempre a nossa, experiência. São os restos que não conseguimos assimilar durante a nossa actividade que é depois verificada pelo cérebro, por assim dizer.”
“Então os sonhos são para todos? Todos somos loucos, inteligentes, velhos, novos, e a perseguição dos sonhos, quando se deseja, pode ser um coisa boa, mas apenas se for dentro do reino do possível. Se não é possível, então é mesmo para os loucos.” A voz do homem frágil e ingénuo tinha estado a subir gradualmente até à forma de um grito.
“Não, não meu coitado! Os sonhos são presenças metafísicas de eventos do subconsciente. E tratados no nosso cérebro.”
“Então não confias nalguma entrega divina? Na mensagem de algo superior através de algum mecanismo sobrenatural, de que nós somos os receptáculos? Pessoas como tu são especialmente abertas a perspectivas semelhantes.”
“Não. E não tentes pensar que sabes alguma coisa sobre mim. Acredito que o corpo funciona de maneira a aguentar a pressão que, obviamente, não conseguimos aguentar. Todos dormimos. E porquê? Para descansar, especialmente o cérebro, mas sem nunca o desligar.” disse o homem sombrio, ao olhá-lo de lado e acendendo um cigarro. Afasta o fumo com um sopro e endireita-se, como se fosse discursar.
“A meu ver, e digo a meu ver, porque neste momento o que interessa não é o resto do mundo, mas nós. Mais ninguém interessa porque é indiferente o que o resto da população humanóide (humana de uma forma ou outra) posso fazer para evitar o que se vai passar aqui, esta noite. A meu ver, os loucos são considerados loucos por terem a coragem de fazer o que for preciso para evitar sentirem-se descontentes, tristes, deprimidos, até ao ponto de passarem por animais assustados e ignorantes, por coitados. Mas apenas assemelha-se assim, porque a grandeza de saber um coisa e avançar sobre ela é muito mais certa do que uma vida de mentiras.”
“Não podemos ficar apenas contentes pelo que temos, pelo que amamos, pelo que sonhamos, e apenas sonhamos?” chora o homem frágil, decepcionado com o rumo que a conversa estava a tomar.
“Podemos. Mas se esse contentamento que falas reside apenas nos sonhos, e para obtermos essa alegria tivessemos que concretizar os nossos sonhos? Aí já não seriamos loucos, pois não?” sorriu maliciosamente o homem dominante da conversa.
“Vejo que não respondes, por isso continuo. Eu sou louco. Eu corro nos calcanhares de um sonho. Já o concretizei, concretizo-o hoje, e continuarei a concretizá-lo. Para o resto do mundo aparento ser igual, normal, seu semelhante. O resto do mundo não interessa. E tu, e o teu comentário, não interessam.”
O homem frágil encolheu-se perante o homem sombrio. O ritmo das passadas dele juntaram-se consonânticamente ao ranger das cordas que o homem frágil tentava soltar, mas que se tornava mais díficil com o nervosismo espasmático e o pânico.
“Não vale a pena” e cortou-lhe um traço ao longo do pescoço, enquanto olhava para os olhos da sua vítima.
“Agora já não sou louco. Mas contente, seguro, como o resto do mundo.”

Um comentário:

Tania disse...

Look who's back!!!

...gostei, vá!