terça-feira, 1 de maio de 2007

Gravidade

Com um cansaço absoluto da mente, demente ao ponto de virar as costas à lucidez do dia matinal, verteu lágrimas de alegria calma ao perceber o sentido das noções utópicas do fundamento fraco de liberdade e convivência. Não podendo realmente sentir alegria, nem calma nem agitada, as lágrimas caíram à terra seca, criando rachas geométricamente estruturadas. Olhando para as cavernosas cavidades da terra, e admirando a sua organização, jogou-se para dentro na hipótese de bater com a cabeça ou com o ombro em alguma coisa afiada. Raios fugitivos e sombras da luz respicaram-lhe os olhos ao longo da descida, e os espelhos que espelhavam as luzes criavam formas intrínsecas e complexas, dignas de choro. Explorava a descida, e sentia-se a subir. Alguma emoção estrangeira ao seu organismo acabava de chocar com os seus músculos tensos, dilatando-os. A calma e o clamor de emoções criaram um fluxo de pânico. Sabia que a aterragem iria doer, por isso, para se abstrair, manteve-se a observar minuciosamente os reflexos da luz, que criavam túneis e grutas escondidas pelas sombras. Parecia-lhe que cada vez que encontrava uma caverna ou um túnel novo encontrava outros de seguida, e passaria para a observação sequencial deles, esqueçendo os outros, e assim consequetivamente. Cansado, quis subir, mas apercebeu-se que ainda estava a descer. Via, clara como o dia, uma lágrima do tamanho dele, a cair ao seu lado e ao seu ritmo. A água reflectia-lhe o rosto, distorcido porém. Reflectia ainda as luzes e os espelhos e as cavernas e os túneis. Estavam a cair em direcção ao fim, mas se era para cima, não sabia. Foi súbitamente agarrado por um estalo barulhento, o som de ossos a partir, e, de novo com os pés na terra e ao ar livre, viu a lágrima a aterrar e a alterar a terra seca.

Tomás J. A. Pinto

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